quinta-feira, 31 de março de 2011

O Espaço Vazio - Peter Brook

O papel do encenador é estranho: ele não pede para ser Deus, mais isso está implícito na sua função. Quer ser falível, mas os atores conspiram instintivamente para que ele seja um árbitro, pois há uma necessidade desesperada de que exista constantemente um árbitro. Num certo sentido, o encenador é sempre um impostor, alguém que nos guia à noite por um território que desconhece - mas que também não tem outra hipótese, pois é obrigado a guiar, aprendendo o caminho à medida que vai avançando. O aborrecimento mortal começa a rondar quando o encenador não reconhece esta situação e fica à espera que tudo corra pelo melhor - quando devia era encarar o pior. (pg. 53)

Carta aos Atores - Valère Novarina

O quê, o quê, o quê? Por que se é ator, hein? Só é ator quem não consegue se habituar a viver no corpo imposto, no sexo imposto. Cada corpo de ator é uma ameaça, a ser levada a sério, para a ordem ditada ao corpo, para o estado sexuado; e se um dia a gente está no teatro, é porque tem algo que a gente não suporta. Existe em cada ator algo como um corpo novo que quer falar. Um outra economia do corpo que avança, que empurra a antiga, imposta. (pg. 23)

Teatro pós-dramático

O "estar exposto" do ator não é filtrado pelo papel e pelo drama. O corpo se aproxima do espectador de modo ambivalente e ameaçador - porque se recusa a se tornar substância significativa ou ideal e passar para a eternidade como escravo do sentido/ideal.

(...)

o performer (...) de certo modo se apresenta como um vítima sacrificial: sem a proteção do papel, sem o fortalecimento por meio da serenidade idealizante do ideal, o corpo está também entregue, em sua fragilidade e aflição, como estímulo erótico e provocação ao julgamento dos olhares que avaliam.
A partir dessa posição de vítima, porém, a imagem corporal escultória pós-dramática se converte em um ato  de agressão e questionamento do público. Na medida em que o ator o encara como pessoa vulnerável, individual, o espectador se torna consciente de uma realidade que é oculta no teatro tradicional, ainda que ela inevitavelmente faça parte da relação do olhar com o "espetáculo": o ato de ver que se aplica de modo voyeurístico ao ator exposto, como se ele fosse um objeto escultural. Nenhum ordenamento narrativo ou dramatúrgico serve aos observadores como "desculpa" para encarar as pessoas no palco. O espectador se encontra sobretudo na situação de um voyeur que se torna consciente da realidade - mesmo de sua ambiguidade -, na qual, ademais, é flagrado, por assim dizer, pela técnica da confrontação acentuada, pelos olhares dirigidos diretamente ao público, pela frontalidade do ordenamento arrancada a segurança imaginária do voyeur. (pg. 345 e 346)

Music Hall CanCan

"A única coisa que todos os tipos de teatro têm em comum é a necessidade de um público."

Peter Brook

quarta-feira, 30 de março de 2011

Eu não queria estar aqui essa noite...

"Eu não queria estar aqui essa noite. Eu só aceitei porque as pessoas que estão são minhas amigas e eu não sei dizer não. – Eu nem gosto dessa marca. – A gente vive reclamando que não tem espaço pra criar, de não ter verba, de querer fazer tanta coisa boa... e quando chega esse momento não ter nada pra dizer. Os ensaios são frustrados... e eu acredito que quando a gente tiver público a gente vai saber o que fazer, ou pelo menos vai ter o prazer de tentar fazer alguma coisa."

Mariana Teixeira

quarta-feira, 16 de março de 2011

Som e Furia - Episodio 9 2/4



- Auditoria da declaração de imposto de renda de Elen Vanu (Andréa Beltrão).
- Ricardo (Dans Stulbach) contrata "Rodrigo Santoro" para fazer uma campanha para aumentar o público do Teatro.

Referências - dançarinas de cabaré elegantes e decadentes


Vermelhos Balões Vermelhos por Caio Riscado

"- Tem 30 pagar, Di.
- E daí?
- Dou o sinal?
- Sim. Claro. Que importa quantos tem? Importa que cada um de nós faça o que tem que fazer... até... até acabar estatelado no chão do picadeiro... Se acabando, mas com a glória de escutar ainda a orquestra tocar o galope. Assim é que é. Vamos lá, retire a rede e dê o salto mortal.” p.41 (MARCOS, Plínio).

Com palavras diferentes, mas mesmo significado e força o texto de “Vermelhos Balões Vermelhos” termina como a passagem acima que foi retirada do livro “O Assassinato do Anão do Caralho Grande”, de Plínio Marcos. A escassez de público é um sintoma que aflige grande parte dos artistas que precisam da platéia presente para a realização de suas obras. Por outro lado, ainda vemos poucos movimentos que tentam contornar essa situação. Os artistas continuam estreando, mas para quem? Se sabemos que corremos o risco de não termos público, porque continuamos a acreditar e lutar pela realização de nossos projetos?

Talvez, responder com exatidão a essas perguntas seja uma tarefa impossível. Mas o que não podemos fazer é deixar de falar sobre elas e a política que as cercam. Hoje, vejo um circuito de teatro independente que tende a crescer cada vez mais. Porém, esta vontade de vê-lo tomar a cidade e seus teatros parece se manifestar somente nos seus próprios feitores, idealizadores, ou seja, “gente de teatro” também como estudantes e professores da área.

A meu ver, vivemos um momento onde o teatro só parece ser necessário para quem o pratica. A cada ano que passa é notável o aumento do número de estudantes que saem do segundo grau e pretendem ingressar em um curso universitário voltado para segmentos da arte. O que mais me comove nesta constatação é que o mercado de trabalho e a parcela do público interessada em arte não crescem desta mesma forma. Mas o que pensam todos esses artistas? Como vão sustentar suas famílias se dependem do ingresso pago pelo público para isso? “Vermelhos Balões Vermelhos” também nos faz essas perguntas e seus personagens chegam a constatar que estão pagando para fazer cultura. Pagam os artistas e também o público que, com o valor alto de seu ingresso, ajuda a custear o espetáculo que assiste. Bom, se o dinheiro do público não vai para o artista, quem paga as suas contas?

Deparamos-nos então com outro sintoma que aflige a classe artística: o segundo emprego. Para poder bancar seus sonhos, suas produções muitos de nós artistas precisamos apelar para uma segunda profissão. Esta, muitas vezes, não está relacionada a criação artística. Mas é o que mantém nossas presenças nos intermináveis e não remunerados horários de ensaios em que precisamos estar presentes. Ficamos aprisionados em um ciclo onde o que nos dá dinheiro não é o que amamos fazer, mas sim o que banca nossos encontros para com os nossos amantes.

Penso que escolhemos uma profissão que é mais encarada como estilo de vida do que como ofício. Talvez, por precisarmos nos render a máquina do capital, deixando nossos sonhos em segundo plano, sejamos nós mesmos uma espécie de contribuintes para a sustentação deste preconceito. Precisamos encontrar uma saída, mudar o rumo de nossa história. E se todos nós aderíssemos a um teatro de resistência, largássemos nossos segundos empregos e seguíssemos fazendo teatro e morrendo de fome, chamaríamos mais atenção? Chegaríamos a um momento onde não haveria mais força para encarar um palco ou picadeiro, alguém sentiria a nossa falta? Se, de acordo com o nosso plano de governo, todo cidadão tem o direito de ter acesso a cultura é por que em algum momento ela foi requisitada. Será que precisamos recuperar este momento? Será que nossa forma de expressar nossos sentimentos foi ultrapassada e não se encontra mais dentro da denominação de cultura?

Para o governo que disponibiliza algumas formas de incentivo, a guerra pelos editais deve parecer natural, satisfatória. Mas até na competição dos editais oferecidos para a nossa classe encontramos problemas. Se, muitos editais, classificam como “iniciante” um grupo ou coletivo que tem no mínimo cinco anos de experiência, onde nos enquadramos nós, formandos? Onde encontramos a cartilha que nos ensinará a manter dois empregos, durante cinco anos até podermos concorrer a um edital e, com sorte, pensar em ganhar um salário fixo, que nem sempre é possível?